Por Eder Barbosa de Melo
Confesso: tenho vivido tempos de desmotivação espiritual. Persistindo para não ser atropelado pela série de conflitos que surgem todos os dias entre os cristãos, tentando engavetar pensamentos que teimam em me amofinar.
Por longos anos, tenho tentado não perder o rumo. Sei que viver para Deus é questão de motivação. Meu esforço se concentra em não me permitir esfriar, me afogar na letargia evangélica e chegar tamanha apatia de frequentar a igreja por mera obrigação dominical, ou cantar só para acompanhar o coro costumeiro, pegar carona na fé, um crente no piloto automático.
Se já não me resta paciência para esse evangelho desbotado, constato que muitos cristãos sofrem voluntariamente de um mal que repudio, a manipulação.
Não dá pra negar, chega de hipocrisia, a manipulação é uma realidade da igreja. Ela está presente em diversas áreas eclesiásticas, principalmente as que lidam com “mordomias” políticas e econômicas. Estou cansado de ver lideranças cristãs focalizando suas motivações na temporalidade, no poderio sócio-político que visa angariar recursos para seus projetos megalomaníacos tendo como mão-de-obra barata um rebanho alienado.
No meu exercício de detectar incoerências dos discursos articulados nos púlpitos, recordei-me de um longa com um roteiro instigante, O show de Truman, o show da vida (The Truman show) de 1998, protagonizado pelo ator e comediante americano Jim Carrey. A trama conta a historia de um vendedor de seguros (Truman/Carrey) que mora com a esposa num paraíso pacífico, onde todos convivem harmoniosamente. Na realidade, a vida Truman é uma grande mentira. Trata-se de um reality show de sucesso no mundo inteiro.
O show de Truman discorre com clareza sobre aspectos sociais pertinentes a começar pelas relações sociais e afetivas do protagonista, todas falsas e inconsistentes, e critica a hegemonia televisiva, bem como a alienação das massas quanto a alguns tipos de programações.
O artificialismo moderno é o pano de fundo de um drama que alerta para o fato de que as pessoas podem estar vivendo sob a manipulação. As regras eram ditadas de maneira capitalista, tudo era comercial e o programa era um fenômeno de audiência. As pessoas estão sempre querendo interferir na vida dos outros. O show de Truman era viciante!
O grande manipulador era o diretor do programa, que se considerava uma espécie de deus, sendo Truman a sua criação. Relação verossímil com as atitudes de alguns líderes religiosos. Ostentam boa intenção engendrando um discurso convincente, mas que na verdade querem ser roteiristas e diretores do cenário evangélico, usurpando da boa fé alheia, estabelecendo uma opressão dominadora, burlando a Palavra de Deus para construir um sistema fantasioso, onde as pessoas preferem viver de ilusão. Durkheim definiria como Coerção social, isto é, a força que os fatos exercem sobre os individuos, levando-os a se conformarem com as regras da sociedade em que vivem, independentemente de suas vontades e escolhas.
Truman não tinha consciência de sua condição. Um pássaro engaiolado cujo direito de voar lhe foi roubado. É triste se conformar com uma verdade convencionada para favorecer alguém. Quando começou a desconfiar da realidade, ele percebeu que precisava de explicações, precisava sair da esfera da artificialidade, precisava enxergar a luz, tinha necessidade de viver.
Os homens estão transformando o cristianismo numa sensaboria. Colocam-se num nível de superioridade hierárquica que os estabelecem acima de qualquer crítica ou reflexão, tudo em nome de Deus. Porque ungido é ungido. Logo, ungido está acima do bem e do mal, um semideus. Morte aos censores do ungido. Morte a todo aquele que ousar desconfiar da artificialidade religiosa. Incontáveis tentativas de assassinato contra minha fé.
Sinto piedade do deus que a igreja criou. Um deus que enjeita o necessitado e que só serve de argumento de manipulação, um deus político que confere poder de igualdade a quem se diz servo, um deus deturpado que escraviza os incautos na mediocridade. Todo ídolo será desbaratado pela verdade. Eu sei que vive o meu redentor, meus olhos contemplarão.
Tenho necessidade de respirar algo novo. Tenho necessidade de viver.